A
TRADIÇÃO DA FESTA DO DIVINO EM BROTAS DE MACAÚBAS
O tropel dos cavalos desperta a multidão e aumenta a
algazarra.
À frente, um
cavaleiro se destaca vestido de vermelho com uma bandeira
igualmente vermelha com uma pomba branca estampada.
Atrás, um grande número de homens e mulheres montados a
cavalo irrompe pela entrada da cidade ao som de sanfoneiros
e sob o espocar de foguetes. A criançada corre de um lado
para o outro, a multidão se agita e as palmas celebram um
momento mágico –
a entrada
triunfal do imperador do Divino.
Esse ritual acontece todos os anos, há mais de uma
centena de anos, na cidade baiana de Brotas Diamantina,
incrustada feito um diamante valioso no coração da Chapada
Diamantina (600 quilômetros de Salvador). A Festa do Divino
acontece 40 dias depois da Páscoa quando a Igreja Católica
celebra o Pentecostes (passagem bíblica que mostra a descida
do Espírito Santo em forma de línguas de fogo, levando
sabedoria aos apóstolos de Jesus Cristo).
Na véspera de Pentecostes, dia de sábado, acontece a
Cavalaria – uma tradição introduzida na região de Brotas de
Macaúbas por imigrantes portugueses no final do século
XVIII. É deles também a Procissão do Mastro (que lembra a
trajetória de Jesus a caminho do Calvário) e a Fincada, além
do Baile dos Cravos Vermelhos (tradição que começa a
desaparecer), que integram o calendário de uma das mais
populares festas religiosas do interior do Brasil.
Em
Brotas de Macaúbas, onde o sertanejo é simples e sofrido,
ainda persistem traços do sotaque português em alguns
trechos da Ladainha do Divino
que os fiéis –
ou não – repetem de casa em casa na visita da Bandeira, e
que os brotenses chamam de Esmolas. Esse ritual, cheio de
significado e ajuda na integração social entre os moradores,
está sendo desvirtuado ultimamente tanto por imposição da
Paróquia como pela falta de uma política pública cultural
que garanta a tradição.
LADAINHA DAS
ESMOLAS
É chegada em vossa casa
Uma formosa bandeira (bis)
E nela vem retratada
Uma pomba verdadeira (bis)
Divino Espírito Santo
Em vossa morada entrou (bis)
Vem correndo a freguesia
Visitando os morador (bis)
Essa pomba que aqui vem
É de Deus muito louvada (bis)
São as mesmas três pessoas
Da Santíssima Trindade (bis)
Vem pedindo a sua esmola
Que muito carece dela (bis)
Para serem festejadas
Dentro de sua capela (bis)
Divino Espírito Santo
Dono do Sol que nos cobre (bis)
Ele é dono do tesouro
Pede esmola como pobre (bis)
Ele pede é por pedir
Mas não é por carecer (bis)
Pede para experimentar
Quem seu devoto quer ser (bis)
Divino Espírito Santo
Divino consolador (bis)
Consolai as nossas almas
Quando desse mundo for (bis)
Quem se benze com a bandeira
Desse Divino Senhor (bis)
Benze Deus na sua graça
Dentro do seu resplendor (bis)
Quem dá esmola a esse santo
Não repara o que vai dar (bis)
Seja dez reais ou vinte
Fica mil em seu lugar (bis)
Deus lhe pague a esmola
Deus lhe dê muita saúde (bis)
A esmola é caridade
A caridade é virtude (bis)
Deus lhe pague a esmola
Se vos derem com grandeza (bis)
Deus permita que por ela
No reino do céus se veja (bis)
As Esmolas começam a ser “cantadas”
desde o mês de março, em plena Quaresma, pois precisa
percorrer todas as vilas, distritos, comunidades e lugarejos
da Freguesia. O imperador leva a bandeira e o povo o
acompanha junto com sanfoneiros. Esse
ritual que mistura festa e devoção é motivador da força da
fé que vai desaguar na grande manifestação de alegria que a
Festa do Divino se reveste.
Orgulhoso por manter viva
uma tradição que remonta das Cruzadas – das lutas entre
cristãos e mouros -, o povo de Brotas de Macaúbas
sabe que foi ali, da pequena vila criada ao redor da Igreja
de Nossa Senhora de Brotas, que a devoção ao Divino Espírito
Santo se espalhou pelo Brasil afora. Conta-se que desde que
a filha de um rico fazendeiro lusitano perdeu a vaquinha de
estimação, encontrando-a mais tarde no Boqueirão que dá
origem ao povoado, depois vila e sede do município, que o
Divino é festejado.
O
RUPIADO
Se uma comida pode bem representar a cozinha de Brotas
de Macaúbas, está sem dúvida é o Rupiado. O prato típico,
iguaria é dos mais populares e serve, principalmente, para
curar ressaca. “Levanta defunto da cova”, costumam dizer
seus apreciadores. Há muitas quituteiras com a receita na
ponta da língua, mas a que damos aqui é da professora Lícia
Martins, especialista e PhD em Rupiado.
Ingredientes:
Carne moída
Vinagre
Cebola picadinha
Tempero verde
Tomates aos pedacinhos
Pimentão
Cominho
Sal e pimenta a gosto
Ovos
Farinha de mandioca
MODO DE
FAZER
Refogue a carne temperada no sal e no cominho e no vinagre.
Adicione a cebola, alho e pimentão. Depois os tomates. Deixe
cozinhar com água como se fosse para uma sopa. Adicione os
ovos inteiros e deixe cozinhar um pouco. Vá misturando os
ovos ao caldo e adicionando a farinha com o tempero verde
(salsa, coentro e cebolinha) até formar um angu com a
consistência para ser tomada como sopa. A pimenta é o toque
opcional.
COMO CHEGAR
Chega-se a Brotas de Macaúbas, de Salvador, pegando a BR-116
depois de Feira de Santana até o Posto Paraguaçu, quando se
toma a BR-242 (Bahia-Brasília). São 600 quilômetros com
direito à paisagem inóspita da caatinga, mas passando por
lugares deslumbrantes da Chapada Diamantina, como o Morro do
Pai Inácio e a Serra da Mangabeira. Brotas fica 140 depois
da cidade de Seabra – 30 quilômetros após da descida da
Mangabeira e a perigosa serpente de curvas, se pega a
rodovia estadual (42 quilômetros), a partir do Entroncamento
(Posto Luisão).
A estrada para Brotas no momento (outubro de 2005) está
muito descuidada, com buracos pão longo de toda a pista. Mas
a paisagem gratifica, descortinando belíssimas serras,
culminando com a verdadeira miragem da natureza que é o Vale
da Colônia, com suas fazendas de muito verde. A cidade de
Brotas de Macaúbas é cercada por morros, estando a 1.184
metros de altitude, o que lhe empresta um clima ameno. De
dia o sol é tórrido, mas as noites de inverso são de muito
frio mesmo.
Para quem vem de Brasília o caminho para Brotas é inverso,
mas atravessa a mesma BR-242, no sentido contrário, passando
por Barreiras, atravessando o Rio SÃo Francisco em Ibotirama,
de onde segue-se até a entrada da Brotas.
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