Festa do Divino

por Paixão Côrtes

Embora as solenidades religiosas em homenagem à pombinha do Divino, lastimavelmente, estejam, nos dias presentes, perdendo muito da grandiosidade dos acontecimentos clérigo-sociais do passado, e até mesmo desaparecendo, merece citar-se, atualmente, Criúva (Distrito agro-pastoril de Caxias do Sul), os festejos vividos nos Municípios de Carazinho, São Lourenço do Sul e São Sepé.

É bem verdade que, nesta última localidade, O Divino não guarda o esplendor de 40 anos atrás, isto é, quando as bandeiras eram espargidas com água benta pelo pároco antes de saírem em sua missão precatória para o interior do Município; nem é servida a mesa-farta (bodo) aos convidados especiais no antigo Teatro Municipal (hoje desaparecido), antes do baile festivo; tampouco, a Medida (ex-voto através de fita vermelha) do pagamento da promessa obtida, tem o tamanho do comprimento do devoto ou de região do seu corpo, ou ainda é oferecida pelo festeiro. No entanto, são vistas as presenças dos Meninos Imperador I e II, acompanhados das Meninas Imperatriz I e II com vestes palacianas; a coroa de prata do Imperador Festeiro; a corte das Aias com roupas especiais; a procissão pela cidade das bandeiras entrecruzadas; o cerimonial da troca destas entre os velhos e novos Festeiros, além do plantar do mastro colorido com a bandeira do Divino à frente da Igreja.

É justo reconhecer, também, que a comunidade católica sepeense ainda preserva uma série de atos e figuras de antanho, como por exemplo, a do Pajem-do-Estoque, a quem cabe a função de estocar, recolher os donativos doados pelos devotos, similarmente como Procurador (percurador) de outras regiões, além do Capitão-do-Mastro, Alferes-da-Bandeira, Tenente-da-Fogueira e os Mordomos adultos.

 

Para termos unia idéia como se desenvolveu a festa do Divino, nesta cidade, em 1983, transcrevemos o seguinte programa:

"Os festeiros, juntamente com a comissão da Igreja, têm o prazer de convidar V. Sa. e Exma. família para a festa do DIVINO ESPÍRITO SANTO, a ter lugar na Igreja Matriz e no Salão Paroquial de São Sepé, nos dias 20 e 29 de maio de 1983.

Horário da Novena e Missa: 19 horas.
Jogos no Salão Paroquial após a Novena.
Leilões no Salão Paroquial dias 27 e 28 de maio, às 20 horas.
Churrasco: dias 22 e 29 de maio.

FESTEIROS:
Vilmar José de Vargas e Maria de Lourdes Teixeira Vargas

PAJEM DO ESTOQUE:
Aldo Machado de Vargas e Celis Vargas de Vargas

CAPITÃO DO MASTRO:
Dilar Scherer e Ceni Braga Scherer

TENENTE DAS FOGUEIRAS:
Valmor Moro e Giorgina Posser Moro

ALFERES DAS BANDEIRAS:
Edgar Pacheco Figueiredo e Zulmira M. Pereira Figueiredo

SUPLENTE:
Zenir Machado e Terezinha Machado

PADRES:
Ireneu Stertz, Hermeto Mengarda e Carlos Ivo Menegais.

Além de São Sepé, e, ainda em caráter citadino, Carazinho vem, desde 1945, ininterruptamente, revivendo as Festas do Divino, através da Paróquia Nosso Senhor Bom Jesus.

Segundo informações que colhemos da professora Erica Kasper Birkhan, no ano de 1983, esta festa votiva continuou com significativas celebrações urbanas. Além do que já escrevemos em nosso livro "Folias do Divino", no presente caso, destacamos os seguintes momentos:

 

  1. O Imperador-Festeiro é escolhido, anualmente, no último dia da novena, sorteado entre 20 nomes de fiéis, indicados pela diretoria da Irmandade da Igreja;

     
  2. O símbolo estatutário do Divino Espírito Santo, que permaneceu um ano na residência do Imperador sorteado, é levado em andor e procissão até a Igreja, no primeiro dia da novena, aí ficando pelo período da mesma;

     
  3. Cabe, também, ao Imperador, com freqüência programada, levar de sua casa e em cortejo, a bandeira do Espírito Santo à Igreja, sendo sempre acompanhado pelos Pagens — em roupa representativa, especialmente confeccionada — os quais carregam, em almofadas de cetim vermelho, a Coroa e o Cetro do Imperador, simbolizando Majestade e Poder de Deus. Logo a seguir seguem os familiares e o povo em geral;

     
  4. Na Igreja, em tronos decorados, o Imperador e os Pajens ficam à direita do Sacerdote. Para a Senhora do Imperador e familiares estão reserva-dos lugares especiais em banco, junto aos fiéis;

     
  5. Os donativos em dinheiro destinado à Igreja, são oferecidos em envelopes especiais, que os fiéis recebem antecipadamente, em suas residências, por ocasião do peditório na visita da Bandeira. A entrega dos mesmos dá-se por ocasião da novena e missa, quando os Pagens, portando as Cestas de Ofertas — especialmente forradas e decoradas em vermelho — passam as mesmas por entre os presentes, durante os atos celebrados.

     
  6. No encerramento da Festa do Divino, este símbolo estatutário religioso é levado no andor, para a residência do novo Imperador em procissão reza-da e cantada, onde permanece por um ano (semelhante, na Ilha de S. Miguel, no arquipélago dos Açores, verifica-se ainda nos dias presentes esta tradição com seu padroeiro). O Imperador oferece sua residência e convida o povo para rezar ali, o terço em determinado dia da semana, junto ao referido símbolo católico;

     
  7. Como ato final de Festa do Espírito Santo dá-se o almoço de confraternização, cujas presenças se fazem através de cartões-ingresso adquiridos antecipadamente.

     

    O Divino em Santo Angelo e Soledade

    No município de Soledade, pelas plagas dos Ibirapuitan (Informante: Prof. Diniz Danilo da Silveira), ainda hoje vê-se a Bandeira do Divino, através de foliões, fazendo peditório cantado para a festa do dia dessa figura santificada. De casa em casa, este estandarte sacro, acompanhado de devotos, abençoa residências rurais.

    Nos locais de pousada da Companhia (ou Comitiva) dos foliões, depois dos "terços-de-campanha", é freqüente, à noite, acabar em fandango custeado pelo dono da casa.

    No dia devocional do santo, os donativos arrecadados — galinhas, ovelhas, leitões etc. — são reunidos cm local particular, e oferecidos a toda a comunidade, numa espécie do tradicional "bodo", em almoço festivo, sendo habitua distribuição, também, de alimentos a pessoas carentes e até mesmo na realização de mesa-de-inocente.

    Se por ventura houver leilão, o dinheiro arrecadado destina-se à capela rincão.

    Em alguns rincões do nosso interior, como é o caso nas plagas da antiga Redução Jesuítica de São Miguel (4° distrito do município de Santo Angelo) (Informante: Prof. Joaquim Manoel Rolum de Moura), nos dias presentes, nos últimos anos, vê-se, quando em tempos de secas brabas, a "Bandeira do Divino" sendo carregada, a cavalo, em peregrinação toada, evocando chuva.

    A bandeira — que é particular — sai da residência rural de um devoto e visita casas e ranchos, com grande acompanhamento de fiéis.

    Atendida a promessa com a chegada das chuvas e salva a produção agro-pastoril, faz-se um grande baile numa estância. Ali diante de improvisado oratório e cercado de velas e ex-votos, a pombinha do Divino presencia os pares dançarem a noite toda ao som de gaita, enquanto, lá fora, o churrasco gordo é cortado à vontade...

    Afinal, tem que ser comemorada a graça alcançada...


    Festa do Divino nos Açores - Portugal







    A mais importante festa religiosa portuguesa é a do Divino Espírito Santo, especialmente no arquipélago açoriano. O festeiro portando enorme coroa, se faz acopmanhar por coroas menores, desfilo público sacro, matança de boi, comes e bees, e a "devoção" dos pães bentos. Tudo a custa de muita reza.




    Vera Maria Randazzo carrega coroa de prata, tendo ao seu lado o pajem Waldir Barcelos, com o tradicional espadim. Mordomas, bandeiras contemplam a corte do festeiro-Imperador Sr. Armando e Senhora. (Santo Antônio da Patrulha, 1952)




    O Imperador-Festeiro carreg a "sua" bela coroa de prata com respectivo cetro. Vê-se ainda, o Menino-Imperador ou "espadim", Rubens Lemos Soares e o Alferes da bandeira, Fernando Terra Pereira (Mostardas, 1970)



    Preciosos artesãos gaúchos demonstravam toda sua capacidade artística e de fé religiosa na confecção artesanal, em prata, em ouro, em metal branco e madeira no adorno às bandeiras do Divino.






Origem: Livro "Folclore gaúcho", de J. C. Paixão Côrtes. Corag. reedição de 2006.

Publicado por Roberto Cohen em 05/05/2007.