TASSINARI, Antonella Maria Imperatriz. 2003.

  No bom da festa: o processo de construção cultural das famílias karipuna do Amapá. São Paulo:

EDUSP. 413 pp.

 A festa do Divino Espírito Santo, as festas de santos católicos padroeiros das Aldeias, a festa do Turé, as comemorações do dia Sete de Setembro e do Dia do Índio, as assembléias indígenas e os torneios de futebol constituíram-se no foco da análise de Antonella Tassinari e resultaram na etnografia da população Karipuna do Amapá.

 A população Karipuna se compõe de aproximadamente 1700 pessoas quase todas residentes às  margens do rio Curipi no norte do Estado do Amapá, que convivem com Galibi-Marworno, os Palikur e um pequeno grupo Galibi. O termo Karipuna indica “uma identidade de ‘índios misturados’, ‘civilizados’ ou ‘avançados’, que é tanto atribuída como assumida pelas famílias. (p. 16)

 O Turé karipuna é considerado pelas famílias Curipi oportunidades de dançar, beber e cantar com os karuãna e de lhes oferecer caxiri como reconhecimento das curas que fizeram através dos pajés. Faz parte de um conjunto que envolve festas católicas e cívicas. Os Turés são realizados preferencialmente em um final de semana de lua cheia do mês de outubro. A preparação é feita com muita antecedência. Na data próxima da festa, utilizam madeiras brancas e leves para construir os bancos do Turé. Mastros são esculpidos e toras erguidas e cruzadas ao alto.

 A autora ressalta a Festa Grande ou Festa do Divino na qual fica bem visível a forma alegre e dinâmica dos Karipuna. A festa começa a ser organizada um ano antes de sua realização. A tarefa dos festeiros é fazer com que a festa se realize. Eles tomam essa incumbência para pagar uma promessa feita ao Divino ou para a construção de casas e cura de doenças; por isso todos e não somente os festeiros se comprometem e todos se mobilizam na limpeza da aldeia, na preparação dos alimentos e na doação de donativos.

 Os festejos do Divino ou da Festa Grande começam bem antes da quarta-feira da Ascensão e terminam após o domingo de Pentecostes. Na quinta-feira comemora-se a ascensão de Jesus; dez dias depois é comemorado o dia de Pentecostes. Entre os dois dias existem diversas atividades preparatórias e de encerramento. Entre as duas datas há espaço de cinco dias em que as famílias retomam a rotina.

No sábado que antecede o Maiuhi Xapel, os convidados da capela se reúnem para os preparativos e os caçadores recebem munições. No dia do Maiuhi Xapel, os rojões começam cedo. Às 8 horas, a Casa de Festa se enche. Ao mesmo tempo o almoço é preparado com caxiri.

 Na semana da festa os caçadores voltam a receber munições para que a caça seja o bastante para as refeições de três dias de festa. Na terceira noite há a torração do café e uma refeição que preparam o começo da festa no dia seguinte, quarta-feira, que começa com rojões e recebe barcos e canoas de outras aldeias. Na capela enfeitada ocorre a entrega das fitas e a entoação da Canção do Meio-Dia. Às seis da tarde toca o sino 200 da capela para a Ave Maria e o Canto da Boa-Noite. As velas são acesas, e o baile começa. A música é interrompida pelos caciques que aproveitam para discursar. A música pára com os sinos da meia-noite que chamam todos para as ladainhas na capela. Os devotos fazem fila para beijar as fitas da imagem do Espírito Santo. Depois o baile continua. No domingo, há culto pela manhã. À tarde, reunião do Conselho da Aldeia e um novo grupo de festeiros começa a chegar por ocasião da festa grande (Pentecostes), embora os festeiros da Ascensão ainda sejam requeridos para organizar a procissão da Meia-Lua e a derrubada do mastro.

 Após nove dias da Ascensão, os festeiros soltam rojões, e a vila do Espírito Santo começa a ficar cheia.

 A véspera do Pentecostes é o dia da Procissão da Meia-Lua. Tudo ocorre então de modo semelhante à festa da Ascensão. Ao lado do mastro derrubado se manifestam os que querem ser festeiros no ano seguinte. Dão destino ao mastro e a bandeira branca, e a festa continua normalmente com baile na casa das festas.

 Tassinari analisa também ocasiões, em geral festivas, que colocam as famílias Curipi como partes de redes de trocas mais amplas. Reporta-se ao ano de 1920, quando houve uma preocupação nacional dirigida à região do Amapá por ser a antiga zona do Contestado Franco-brasileiro, devido à população local apresentar características “afrancesadas”. Nesse período é introduzida também a escola do Curipi, que tem seu projeto participado pelas famílias Karipunas.