Na
cidade de Goiás há registro que o culto ao Divino
começou em 1.834, quando o Imperador do Brasil ofertou à
província de Goiás as insígnias, a fim de que seu
Presidente (antiga denominação de Governador do Estado)
José Rodrigues Jardim, juntamente com a igreja
introduzisse a devoção e organizasse a festa nos moldes
da Corte.
Contudo, somente em 1.871, o vigário geral Cônego José
Iria Xavier Serradourada reuniu um grupo de senhores e
organizou o sorteio dos cargos que oficialmente são
responsáveis pela consecução da festa, quais sejam,
Imperador, Alferes da Bandeira, Capitães de Mastro e
Mordomos da Fogueira. Os nomes são colocados em um
cálice de prata e os cargos em outro. A Folia do Divino
é formada por devotos, que carregam as insígnias e as
salvas, trajando opas nas cores branca ou vermelha.
Durante três dias (domingo de Páscoa, segunda e
terça-feira) os foliões percorrem trajeto, previamente
demarcado, indo de casa em casa, rezando e angariando
donativos para a festa do Divino. No domingo
subseqüente, a Folia gira nos povoados de Areias,
Bacalhau e alguns bairros localizados entrada da cidade,
como Jardim Vila Boa, Vila União, Vila
Cristina, Vila Papiros e Conjunto Tempo Novo. No segundo
fim de semana após a Páscoa, os foliões viajam para
Goiânia e visitam os Vilaboenses ali residentes. Cabe
destacar que em todas as oportunidades a Folia é seguida
pela Banda do VI Batalhão da Polícia Militar que entoa
os hinos e marchas alegres, que coadunam com o espírito
da festa.
É
muito comum a queima de fogos durante o giro, que além
de sinalizar a proximidade dos foliões; em locais mais
distantes serve para identificar onde um ou outro grupo
se encontra.
Com
o crescimento da cidade de Goiás, novas insígnias foram
introduzidas no roteiro, com o objetivo de viabilizar a
realização do giro nos três dias.
Cabe registrar que a
inserção de outros grupos, portando a réplica da Coroa,
Cetro e Bandeira do Imperador se faz conforme a
necessidade da época.
Dentre cada grupo, uma pessoa fica encarregada de fazer
a inscrição de nome dos devotos que desejam se submeter
ao sorteio para o próximo festejo, e outra se incumbe de
fazer o rol das pessoas que receberão a cesta básica por
ocasião da festa.
A festa do Divino é precedida pela pré-novena
e novena do Espírito Santo.
A pré-novena foi instituída em 1.994 e seu
objetivo é preparar toda a comunidade, principalmente os
bairros mais afastados do centro histórico para a
Novena. Cada animador dos bairros visita os moradores e
registra o nome de quem gostaria de participar do
sorteio da pré novena. Para cada grupo da pré-novena é
entregue uma insígnia, e de uma casa para outra segue em
procissão. No último dia, na entrega da pré-novena, cada
grupo sai do seu bairro em procissão, encontra com
outros grupos, formando uma multidão de devotos em
oração, cada um levando uma oferenda para repartir com
os irmãos (arroz, feijão, óleo etc.), toda doação é
destinada para cesta.
Durante a novena acontece a missa, todos os dias, na
Catedral de Santana, sempre as 19:00 horas. No início da
missa ocorre a entrada solene do Imperador carregando a
coroa, uma pessoa de sua família o cetro, o
Alferes da
Bandeira traz a bandeira e o novenário do dia porta
outra bandeira. Após, existe o costume do novenário do
dia oferecer lembranças, doces, licores etc.
É
tradição, também, durante a novena, a queima de fogos,
às 6:00, 12:00 e 18:00 horas, que fica a cargo do
novenário do dia, Alferes da Bandeira e Imperador.
Um
dos dias da novena, o Imperador reserva para realizar a
entrega das cestas básicas para aquelas pessoas menos
favorecidas e que foram previamente cadastradas.
Cabe
ressaltar que o objetivo da folia do Divino, além de
propagar a devoção, é de reunir recursos para, em mesa
única, servir alimentos à população, independentemente
de classe sócio-econômica-cultural e religiosa.
O
costume de entrega de cestas, foi introduzido em 1.984
visando ampliar o caráter social da festa.
Na
sexta-feira que antecede a festa de Pentecostes, às
23:00 horas, acontece a Serenata do Divino. Os devotos
se reúnem na casa do Imperador, onde é servido um
coquetel, (mesa única) a toda população presente, após
ser entoado o Hino do Divino Espírito Santo. Dali seguem
em roteiro pré-estabelecido, visitam as casas do
Alferes da Bandeira, dos seis Capitães do Mastro e as
igrejas do Carmo, d'Abadia, do Rosário, de São Francisco
e Catedral, oportunidade em que canta-se o Hino do
Divino, sempre acompanhado da Banda do VI Batalhão da
Polícia Militar.
No
sábado, às 18:00 horas, cavaleiros provenientes de
Faina, Caiçara, Itapuranga e da cidade de Goiás,
portando a Bandeira do Divino, encontram o Imperador,
que carrega a coroa e o cetro, rezam no trono do Divino
e participam da missa.
Após
a novena e missa, parte da casa do Alferes da Bandeira a
procissão do Mastro, que é erguido na porta da Catedral
de Santana, ao som de alegres marchas tocadas pela banda
e ante expectativa dos inúmeros devotos presentes.
Segundo consta, para o lado que aponta a bandeira é de
onde sairá o futuro Imperador.
Enquanto a banda toca, entram em cena os
Socadores de Pé de Mastro, pessoas do povo que se
revezam no ofício de socar com pedaços de madeira o
mastro, para dar-lhe firmeza no solo. Via de regra são
servidos licores, enquanto os Socadores entoam a cantiga
Capitão do Mastro.
Na
seqüência ocorre a apresentação dos grupos folclóricos
dos Congo e Tapuio, na porta da igreja depois na casa do
Imperador. O Congo: é um folguedo folclórico, onde os
componentes vestem-se com esplendor. A dança não
representa luta, mas a desconfiança da chegada de grupo
estranho. No final verifica-se tratar de um mensageiro
portando uma carta endereçada ao rei dos Congos. No
final acontece a confraternização.
A
dança dos Tapuios é coreográfica, simula uma luta depois
a reconciliação. Os componentes usam vestes indígenas.
Durante a dança, os índios cantam a música tradicional.
Existe, também, a brincadeira do Pau de Sebo,
que é um varão, sem casca, untado com sebo, e em cujo
ápice são colocados prêmios, como balinhas, bombons,
prendas diversas e até mesmo dinheiro como chamariz,
para quem se aventure a ir lá buscá-los.
No
domingo a Banda do VI Batalhão de Polícia militar
desperta a Cidade de Goiás com a alvorada, percorrendo
várias ruas, depois dirige-se para a casa do Imperador,
onde é servido um café da manhã, por volta das 6:00
horas.
Antes
das 9:00 horas, sai a procissão da casa do Imperador,
que leva consigo coroa, cetro e bandeira, para a missa
solene, oportunidade em que são entoados belos hinos.
Após a missa dá-se início ao sorteio dos novos
festeiros.
Uma
comissão designada pelo Imperador digita todos os nomes
de devotos inscritos durante a novena, em papéis do
mesmo tamanho, dobra-os da mesma forma e os deposita em
um envelope que é lacrado e aberto tão somente na hora
do sorteio.
Da mesma forma, em outro envelope, são
depositados os papéis com os cargos e papéis em branco,
quantos forem necessários para atingir a quantidade de
devotos inscritos. Na hora do sorteio, os nomes são
colocados em um cálice de prata e os cargos em outro. A
comissão escolhe duas criança para, de um a um, retirar
os papéis dos nomes e cargos. A escolha do Imperador é
atribuída ao próprio Divino Espírito Santo.
Após
a missa, o Imperador distribui lembranças, terços,
estampas, medalhas etc e Verônica. Depois segue para sua
casa, com as insígnias, acompanhado do novo imperador.
A Verônica é um doce em formato de medalhão,
que tem no centro e destacado em alto relevo o símbolo
do Divino.
Após
a missa das 19:00 horas acontece a procissão Luminosa do
Divino. No trajeto do séquito, as pessoas enfeitam as
portas da casa, com flores, tecidos etc. No final da
procissão, na Catedral de Santana há bênção dos fiéis.
Na
festa de "Corpus Christi", depois da procissão, ocorre a
posse dos novos festeiro e repassadas as insígnias,
oportunidade em que a bandeira do mastro é retirada da
porta da igreja e entregue ao Primeiro Capitão do
Mastro.
As
insígnias são peças de prata em cujo ápice encontra-se a
pomba representando o Divino Espírito Santo, são elas
coroa, cetro e salva.
A
coroa é o símbolo maior da realeza, utilizada pelo
Imperador durante a festa.
O cetro representa o poder de mando e decisão,
também carregado pelo Imperador.
A salva é uma bandeja de prata, onde são
depositados os donativos, razão pela qual representa a
fartura, prosperidade e a repartição. Sobre ela são
colocados a coroa e o cetro que durante a festa o
Imperador carrega com as mãos.
A
bandeira é feita em tecido vermelho, geralmente veludo
alemão, onde é pintada ou bordada a figura da pomba,
colocada em varão com ponteira (ponta de lança)
metalizada e é usada na Folia, acompanhando a coroa e o
cetro.
Outro
tipo de bandeira é armada em um quadro que sustenta o
tecido onde é pintada ou aplicada a figura da pomba.
O
Trono é armado na igreja para que as insígnias sejam
nele guardadas durante a missa. A ornamentação fica a
critério do festeiro.
O
trono da casa do imperador é uma espécie de altar,
armado em local de destaque, ao qual se procura dar o
aspecto de fausto e suntuosidade, onde repousa a coroa
e o cetro, ladeados pelas bandeiras.
O
Imperador é a figura mais importante da festa, a quem
compete a guarda das insígnias, organiza e arca com as
despesas a ela pertinentes.
Desde a posse a sua casa torna-se a sede do império.
O Alferes da Bandeira é o elemento responsável pela
guarda da bandeira do mastro, pela elaboração do roteiro
da visita da bandeira na casa dos capitães, é
encarregado da ornamentação da bandeira, do andor e da
procissão que se realiza no sábado que antecede o
domingo de Pentecostes.
Aos
Capitães de Mastro, em número de seis (06), compete o
preparo do mastro, o foguetório da hora do levantamento.
Os
Mordomos da Fogueira, que na atualidade não mais
existem, era responsáveis pelas três fogueiras montadas
na praça da matriz.
Os
Novenários, cargos introduzidos na festa na década de
50, são responsáveis pela novena, cada qual no dia em
que foram sorteados. Ajudam o Imperador na organização
do trono, na ornamentação da igreja e na compra de
foguetes.
A praxe é que o Novenário queime foguetes, no seu
dia, às 6:00, 12:00 e 18:00 horas, no que é seguido pelo
Alferes da Bandeira e Imperador.
Os Paraninfos são instituições convidadas
especialmente para participar das missas e da novena,
tais como colégios, entidades de classe, associações,
irmandades, corporações militares, instituições
bancárias etc. Não possuem responsabilidade específica,
a não ser a presença na novena no dia para qual foram
designados.
Os Hinos:
A)
A
Nós Descei (Entoado durante a Folia)
A nós descei, divina luz (2x)
em nossas almas acendei,
o amor o amor de Jesus (2x)
Vinde Santo Espírito, que do céu mandai
a divina luz (2x)
Vinde Pai dos pobres, doador dos dons
luz dos corações (2x).
B) Ó Vinde (Entoado durante a Folia)
Ó vinde em nós Espírito Santo
do céu vossa luz nos mandai
Ó vinde inspirar nosso canto
A nossa frágil e confiança animai
Abrasai em divinas chamas (2x)
Inflamai em celeste ardor
Os nossos corações almas
No mais ardente e no mais puro amor (2x)
Ó vinde ó rico pai dos pobres
e dos fracos reparador
São débeis sem Vós os mais fortes
De todos sois amparo, Pai e protetor.
Abrasai em divinas chamas (2x)
Inflamai em celeste ardor
Os nossos corações almas
No mais ardente e no mais puro amor (2x)
C) Hino de Folia
O Divino pede esmola, dada de boa vontade
lá no céu terás o prêmio, da Santíssima Trindade.
D) Hino do Divino Espírito Santo
Música de Cônego Pio Joaquim Marques
Letra de Cônego José Iria Xavier Serradourada
1ª Parte
É chegado, o Pentecostes
o templo ostenta alegria (2X)
Canta, canta, o povo hinos devotos
Neste majestoso dia (2X)
Sobe aos céus o nosso incenso
Hinos ressoam ao deus imenso (2x)
2ª Parte
Vinde Espírito Divino
os corações acendei (2x)
com todos os que vos louvam
Os vossos dons despendei (2x)
Línguas de fogo o céu derrama
Nos corações acende a chama (2x)
E) Capitão do Mastro
Capitão do Mastro cadê você
Tá debaixo da cama foi se 'escondê'
Um gole de pinga outro de 'licô'
Capitão do Mastro cadê o 'sinhô'.
Mendonça, Belkiss
Spenciére Carneiro de - A Música em Goiás (Gráfica e
Editora Lider - 1.980)
Lacerda, Regina -
Folclore Brasileiro - Goiás (Funarte - 1.977);Etzel,
Eduardo - Divino Simbolismo no Folclore e na Arte
Popular (Livraria Kosmos Editora Ltdª - 1.995);Passos,
Elder Camargo (Pesquisa Levantada e Organizada pela OVAT
- Organização Vilaboense de Artes e Tradições - em
1.991, atualizada em 2.001 e 2.003, que teve como fonte
as seguintes obras {Brown, Jorge - A Festa do Divino em
Vila Boa - "O Popular"-Goiânia, 18/08/74 - Caderno
2;Cascudo, Luiz Câmara Cascudo - Dicionário do Folclore
Brasileiro - 3ª Ed. Brasília - Inst. Nacional do Livro
1972;Costa, Jaime do Nascimento - Histórico da Festa do
Divino Espírito Santo - Resenha Mimeografada - 1.981 -
Complementação da relação de Imperadores do Sr. João da
Costa Oliveira de 1950 a 1.991; Guia do Folclore
Fluminense - Organizado pela Divisão de Folclore do
Instituto Estadual do Patrimônio Cultural - Rio de
Janeiro - 1.985;Júnior, Heber da Rocha Rezende - Festa
do Divino - O Albor, Cidade de Goiás, nº 2 de 01 a
31/05/1980 pág. 5; Jayme, Jarbas - Esboço Histórico de
Pirenópolis - Goiânia - Imprensa da UFGO - 1971;
Lacerda, Regina - Vila Boa e Folclore -
Goiânia/Prefeitura Municipal 1957 - Bolsa de Publicação
Hugo de Carvalho Ramos; Monteiro, Ofélia Sócrates do
Nascimento - Reminiscências, Goiás de Antanho - Goiânia
Editora Oriente - 1974; Oliveira, João da Costa - Hino
do Divino Espírito Santo - Cópia manuscrita de 19 e
relação dos Imperadores de 1872 a 1949;Pohl, João
Emanuel - Viagem no Interior do Brasil - Rio de Janeiro
- Instituto Nacional do livro 1951 2º V; Saint, Hilaire
Auguste de, Viágens às Nascentes do rio São Francisco e
pela Província de Goiás, Teixeira, Amália Hermano -
Folia do Divino em Natividade de Goiás - Revista
Brasileira de folclore - São Paulo Maio/Agosto de 1974;
Pereira, Niomar de Souza Jardim e Veiga, Mara públio de
Souza - Uma Festa religiosa Brasileira - Festa do Divino
em Goiás e Pirenópolis - São Paulo - Conselho Estadual
de Artes e Ciências Humanas - 1978.)
Além das obras acima citadas, os dados foram
colacionados pelo costume e por meio de oitiva de
pessoas como Maria do Rosário Veiga, Elder Camargo de
Passos, Jaime do Nascimento Costa, Silvia Curado, Maria
Antonieta Ramos Jubé, Roberto da Rocha Rezende,
Guilherme Antônio Veiga, Salma Saddi e José Geraldo
Andrade Neto (in memoriam), por Maria Cármen Ramos Jubé.
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