O Apocalipse de São João Evangelista, os Milenaristas e a Renovação das esperanças escatológicas no final do século XII presentes nas concepções messiânicas e milenaristas do sebastianismo dos séc. xvi e xvii em Portugal

 

 

Alberto Manuel Vara Branco*

 

Quando alguém provoca destruição ou deixa algo material ou imaterial deteriorar-se ou danificar-se, estará cooperando com as forças negativas e destrutivas do mundo.

É mister usar todas as oportunidades para impedir que as coisas se estraguem, não importa seu valor.

 

Do Livro Ensinamentos dos Essénios de Edmond Bordeaux Szekely

Com o objectivo de potenciar e dar visibilidade pública para a relevante questão relacionada com o sebastianismo ainda hoje patente no nosso espírito devemos salientar a importância da tradição em Portugal, cuja palavra tem origem na palavra latina tradere, que significava transmitir ou dar algo à guarda de outrem. Na origem, podemos salientar que tradere era aplicada e/ou utilizada no contexto jurídico romano, onde nas leis se regulavam as heranças.

É, pois, com o sentido de herança que desejamos apresentar como um legado não material, mas espiritual, esta pertença do Povo Português o sentimento de saudade, de sebastianismo, de Quinto Império, descrito divinalmente pelo nosso Fernando Pessoa.

Nessa pertença espiritual encontramos a suficiente força para as nossas dificuldades no presente com vista ao futuro.

 

 

1. O Apocalipse de São João Evangelista

 

Besselar (1987) salienta que, nos primeiros séculos da vida do Cristianismo, se assiste à resistência de vários movimentos com interpretações diferenciadas sobre a Bíblia, no Livro dos Profetas (Antigo Testamento) e no Apocalipse (Novo Testamento), dando origem às teorias milenarista.

A partir da interpretação de A Cidade de Deus de Santo Agostinho, estudante de Cartago, nascido em 353 em Tagasto, hoje Souk-Ahras, Oeste Argelino, dá-se a imposição da interpretação compatível com o seu fundamento inicial, conciliando o que diz o texto com o que verdadeiramente queria dizer. A matriz católica entende evitar as múltiplas interpretações, mas, por outro lado, a Igreja impõe que o texto da Bíblia não seja a única fonte, pois há que ter em consideração a tradição para uma interpretação historicamente correcta desse texto.

Segundo Costa et al. (1991), Santo Agostinho, Bispo de Hipona, representa a desvalorização ou a insignificância dos interesses materialistas e terrestres face ao que é real, face à salvação. Ele defende que a única cidade eterna é a de Deus, uma vez que a dos homens não é essencial, é perecível. E ainda para dar mais força à cidade de Deus Santo Agostinho faz uma análise sobre os gestos da oração, sublinhando que o corpo tem um papel importante na condução da oração, pois os gestos estimulam a elevação da alma.

Não nos esqueçamos de que, mais a mais, a Idade Média é, pelo menos até ao século XIV, uma verdadeira civilização do gesto no dizer de Berlioz (1996).

Agostinho de Hipona aproveita para tratar dos mais variados assuntos, nomeadamente o que diz referência às questões escatológicas que o Apocalipse de São João colocara. Sabemos que os textos apocalípticos da Bíblia, entre 200 a.C. e 200 d.C., descrevem em sonhos e/ou visões o combate decisivo entre Israel e os seus inimigos nos tempos derradeiros e o triunfo final do povo de Deus. A descrição é feita por meio de figuras simbólicas, como o leão, a águia e o dragão, por exemplo, cujo significado é explicitado pelo próprio profeta, por um anjo ou por Deus Todo-Poderoso.

No Apocalipse de São João Evangelista, o último dos livros canónicos da Bíblia, há, de facto, uma escatologia, dado descrever com clareza o fim dos tempos e ainda introduzir cálculos numéricos, com alusões relativas ao anticristo, às perseguições dos últimos tempos e ao segundo advento de Cristo.

Os primeiros cristãos, pensando que o fim do mundo estava próximo, aceitavam e tomavam os seus sofrimentos como provações necessárias que tinham que passar para atingir o reino de Deus, aspirando pela libertação e por uma visão igualitária.

Assim, apercebemo-nos como o Apocalipse de São João Evangelista reuniu o messianismo e o milenarismo, pois diz respeito à crença num reinado terrestre de Cristo e dos seus eleitos, com a duração de mil anos.

 

 

2. Os Milenaristas ou Quiliastas

 

O advento do milénio foi concebido como devendo situar-se entre uma primeira ressurreição, a dos eleitos já falecidos, e uma segunda, a de todos os outros homens para serem julgados, de acordo com as suas acções.

Segundo Amante (2001), dois períodos de provações enquadrá-lo-ão: o primeiro será o reinado do anticristo e das tribulações dos fiéis seguidores de Jesus que, em conjunto, triunfarão sobre as forças demoníacas e fomentadoras do mal e estabelecerão o reino da felicidade e da paz. O segundo, mais curto em periodização, será uma nova libertação das potências demoníacas, que serão vencidas num último combate travado com o bem.

Deste modo, o reinado do anticristo, que corresponde a um retorno ao caos e à desgraça, é apresentado sob a forma de um dragão ou de um espírito demoníaco, diabólico, lembrando o antigo mito do combate entre Deus e o dragão, cujo o início teve lugar muito antes da criação do universo e será travado, de novo, no fim dos tempos.

De sublinhar que alguns períodos históricos, particularmente trágicos, foram considerados como dominados pelo anticristo, mas havendo sempre a esperança e a fé de que o seu reinado anunciasse ao mesmo tempo a vinda de Jesus Cristo, O Salvador. Assim, o Apocalipse de São João Evangelista deu origem à seita dos milenaristas, também conhecidos por quiliastas, aguardando a inauguração do reino de Cristo no planeta Terra, após a derrota definitiva do mal.

Sabemos que o Cristianismo na Idade Média condenou, porém, o milenarismo como herético, de índole medonho. No anti-milenarismo oficial da igreja católica romana reconhece-se a primeira manifestação da doutrina do progresso, pois a igreja aceitando o mundo tal qual era, esforça-se por tornar a existência humana menos amarga e desditosa do que o fora durante as grandes crises históricas até então vivenciadas.

A igreja católica romana tomava essa posição contra os profetas e os visionários apocalípticos de toda a espécie, pois os avisos espirituais nem sempre foram bem aceites pela ordem estabelecida.

 

 

3. A crítica aos Milenarismos versus a imposição de uma escatologia oficial e ortodoxa da igreja católica romana

 

Amante (2001) sublinha que, a partir da interpretação de a Cidade de Deus, de Santo Agostinho, os milenaristas vão ser julgados e condenados no futuro pela inquisição por aderirem a certos ideais messiânicos. E é com a escatologia oficial, defendida por Santo Agostinho, que a igreja católica romana vive durante toda a Idade Média.

De salientar a desvalorização da instância política e a valorização da igreja e da Cristandade. Porque a igreja triunfou, o estado é desvalorizado. Mas, a igreja, tornando-se demasiado poderosa e rica, no séc. VIII / X, entra também no "jogo feudal". Como reacção interna da igreja, assiste-se, a partir do século IX, a uma contestação crítica a esse estado de coisas. Esse movimento interno está relacionado com o movimento monástico que tenta regenerar a igreja, distinguindo os interesses de ordem política e económica dos aspectos religiosos.

Sabemos que nos séculos V e VI foi São Bento que iniciou o regime monástico no Ocidente, mas, a partir do século IX, é a Ordem de Cluny, que inicia o combate pela reforma e/ou regeneração da igreja católica romana.

Amante (2001) refere que a crença milenarista, que se baseava em profecias do Antigo Testamento e no Apocalipse de São João Evangelista, foi combatida por Santo Agostinho que interpretou os mil anos do Apocalipse como a Sexta Idade, com período de duração não determinado, reservado ao reinado da igreja entre a primeira vinda do Salvador e a vinda do anticristo. O Bispo de Hipona salienta que a Sétima Idade estava já para além da história e para lá dos fins dos tempos.

 

 

4. O Joaquimismo e o Franciscanismo radical: a experiência monástica na Idade Média com vista a pender o mundo para o domínio do divino.

 

A interpretação literal do texto do Apocalipse de São João, que já havia dado origem nos primeiros séculos da era cristã à seita dos milenaristas, foi adoptada pelo Joaquimismo, movimento profético que apareceu na Península Itálica no decurso do século XIII e que se espalhou por toda a Europa Ocidental.

O Joaquimismo era uma vasta corrente de reforma, tanto da vida eclesiástica e moral, como da organização política e social da época. Era uma resposta à perturbação que se vivia na época.

Joaquim de Fiore (1135 – 1202), abade de um convento da Ordem de Cister na Calábria, com ideias muito controversas, abandona a congregação a que pertencia para criar a sua própria ordem.

Fiore admite dois fins históricos: um situado além da história (a eterna Bem Aventurança) e outro localizado dentro do tempo histórico (o Estado do Espírito Santo). Fiore parte de dois princípios: o número três é a chave (mistério ou dogma da Santíssima Trindade) e o princípio do progresso. Segundo este abade, o caminho dos homens na Terra teria que obedecer a um progresso, que decorria de uma tripartição. A História estaria dividida em três eras sucessivas ou três estados: o do Pai, o do Filho e o do Espírito Santo.

Desta forma, Costa et al. salienta que:

Cada um dos três estados compõe-se de sete idades, em analogia aos dias da criação, seguidos do Sábado e aos sete sigilos sucessivamente abertos pelo Cordeiro do Apocalipse. A concepção da história deixa transparecer no pensamento medieval o seu posicionamento, que até então fora determinado por Santo Agostinho. Enquanto este defendia que com a Encarnação de Cristo acabava a história e nada de especial iria mais acontecer, para Joaquim de Fiore a encarnação não era o ponto final e haveria ainda uma última fase mais perfeita.

Saraiva (1996) salienta que Joaquim de Fiore, partindo de especulações de ordem teológica, introduzira a ideia do progresso histórico, ideia que, com o decorrer dos tempos, se foi desligando do seu contexto original. Os discípulos e os seguidores de Joaquim de Fiore não hesitam em forjar profecias e após a sua morte são fundadas duas ordens mendicantes: a de São Francisco de Assis e a de São Domingos, este o fundador da Inquisição, "o mal amado" no dizer de Vauchez (1996).

Vai caber a Francisco de Assis o papel preponderante para inaugurar o novo estado, no mundo espiritual, pregando o ideal de pobreza radical e, como tal, os seus bens eram colocados sob a gestão da igreja. Vauchez (1996) sublinha que Francisco de Assis estava muito avançado espiritualmente em relação ao seu tempo. O seu apelo à fraternidade universal, com a inclusão dos próprios animais era muito forte de consequências e atributos para a aprendizagem imediata do seu alcance na época. Na sequência dos tempos, no novo estado, a única norma a dirigir a vida cristã seria o Evangelho Eterno, depositado nas obras de Joaquim de Fiore.

De acordo com Saraiva (1996), é um franciscano, de nome Gerardo San Doninno, quem faz a divulgação das doutrinas de Joaquim na Introdução ao Evangelho Eterno, em 1254, livro condenado pelo papado, mas com grande popularidade na época.

Há um grupo que aceita esse acordo, sendo os seus componentes chamados de os conventuais. O outro grupo que o contesta é formado por indivíduos que se denominam de espirituais, tornando-se estes conhecidos por Joaquimistas. Uma parte dos espirituais, os fraticelli, liderados por Angelo Clareno, deixa a Ordem. Para Saraiva (1996), a corrente dos Joaquimistas influenciou muito a dos espirituais, a começar por Frei João de Parma, Ministro Geral da Ordem Franciscana, antes de São Boaventura.

Francisco de Assis, louco ou santo, sonha com o mundo em que todas as criaturas são sagradas e têm direito ao mesmo tratamento de respeito. Os franciscanos chegam a Portugal no século XIII e são eles, com um novo espírito religioso, os introdutores do culto do Espírito Santo, com o apoio da Rainha Santa Isabel de Aragão e Portugal, esposa do nosso rei D. Dinis.

Segundo Saraiva (1996), a grande expansão, que teve lugar em Portugal o movimento franciscano, foi uma resposta e reacção contra o espírito monástico precedente e de um modo geral, contra a burocracia da hierarquia eclesiástica romana.

Por outro lado, Amante (2001) revela que o Joaquimismo dos fins da Idade Média é a esperança na vinda de um grande reformador, que havia de livrar a Cristandade de todos os inimigos internos e estabelecer um reino universal de paz e justiça.

 

 

5. O sebastianismo como fenómeno messiânico de maior projecção em Portugal

 

De acordo com Azevedo (1984), o sebastianismo – messianismo português desenvolve-se em meados do século XVI tendo em atenção a conjugação de dois factores:

De 1545 a 1552, verifica-se uma profunda crise da economia internacional que vem a ter enorme influência na economia portuguesa e com grandes repercussões na nossa sociedade. Esta sociedade, estruturada numa base de relações pessoais que partia sempre do soberano, exercitava-se tanto ao nível político como ao nível económico, através da formação de clientelas bajuladoras que actuavam como grupos de pressão junto do rei, com vista à satisfação dos seus interesses pessoais e dos interesses das ordens nobiliárquica e eclesiástica.

O que de facto aconteceu em Portugal, em 1580, foi Filipe II de Espanha tornar-se rei de Portugal com o nome de Filipe I, por morte do Cardeal-Rei D. Henrique, apoderando-se do trono português.

Antes, em 4 de Agosto de 1578, a história de Portugal marcou encontro com uma tragédia que envolveria muito do seu destino e da sua construção como nação. Os portugueses e o seu rei D. Sebastião, vencidos em Álcacer-Quibir em território marroquino, perdem a sua própria soberania Pátria (Amante 2001).

Desta forma, segundo Pires (1982) o fenómeno do sebastianismo, como versão particular do messianismo, aparece da super-estimação da predestinada gente lusitana e sobrevive porque se constitui uma tarefa impossível, uma vez que o rei está morto. Devido à negação de uma realidade que não se pode aceitar, D. Sebastião torna-se o tema central do grande mito da nacionalidade portuguesa.

Lobo (1982) revela que do messianismo oportunista bragantino, passando pelo mito do quinto império aplicado a Portugal, na visão do Padre António Vieira, o sebastianismo moderno constitui um modelo de afirmação de identidade tendo-se intensificado com António Nobre e os homens da renascença portuguesa, depois da humilhação do ultimato inglês de 1890.

O sebastianismo, que teve em Portugal uma elaboração teórica considerável através de biografias, de estudos e de ensaios de Antero de Figueiredo, Queirós Veloso, Carlos Malheiro Dias e Sampaio Bruno, suscitou também um forte movimento de crítica e de recusa em especial por parte dos intelectuais nacionalistas congregados à volta da Seara Nova (Loureiro: 1978).

Hernâni Cidade (1959) salienta que Fernando Pessoa, na sua obra A Mensagem, se assume como o continuador dessa crença de um futuro melhor, sendo a referida obra um instrumento valioso visando convencer sobre a necessidade e a possibilidade de Portugal vir a cumprir a sua missão histórica de continuar com as glórias de um passado saudoso e longínquo.

Daí que O Encoberto, talvez o mais belo texto da Mensagem, procure chamar a atenção para a construção metafórica do renascer, vir à luz através da gradação de:

De acordo com Bruno (1983), no texto da Mensagem, é tecida a comparação entre D. Sebastião e Jesus Cristo. Aquele morto e enterrado em nome da pátria, Jesus morto em nome do Pai Divino. Ambos, mortos no exercício da protecção da Humanidade, cada qual à sua maneira, voltam à luz para assumir o lugar de origem: um, os céus porque na origem era Espírito; o outro Portugal, porque na origem era Rei. Contudo, o Rei não vem e a metáfora do insólito cobre Portugal, que é o nevoeiro.

De acordo com Saraiva (1996), a partir da ideia de que existe uma inteligibilidade das coisas, negando paradoxalmente a inteligibilidade do caso português, e em lugar de uma explicação tenta inventar para ela um mito, uma divindade, um D. Sebastião negativo, o mesmo autor acrescenta ainda que "a eficiência dos sebastianismos é sempre a mesma, como é sempre o mesmo o seu vício lógico: logicamente, desiste-se da atitude crítica inventando um mito; praticamente, desiste-se da iniciativa repousando no mesmo mito" (p.38).

 

 

6. Conclusões

 

O rei D. Sebastião, o penúltimo soberano da 2ª Dinastia, denominado desde o ventre materno "o desejado", era a única esperança de salvar Portugal de uma eventual sucessão castelhana. O seu desaparecimento em Alcácer-Quibir, em território marroquino, em 1578, desencadeou logo a sua identificação com este mito: o rei retornaria ao trono e fundaria o novo império. As dúvidas levantadas sobre a morte do rei na batalha confundiram-se.

Durante o domínio espanhol em Portugal, com a resistência aos Filipes, nas décadas de 1580 e 1590, surgiram indivíduos que se identificavam como o falecido rei. Os partidários de D. António, Prior do Crato, pretendente derrotado ao trono português, parecem ter sido responsáveis pela associação entre esta crença no retorno de D. Sebastião e as predições de Bandarra, por volta de 1600.

Na época da Restauração (1640), o sebastianismo foi identificado com a nova dinastia de Bragança na sua guerra contra a Espanha, pois o novo rei D. João IV era o "Encoberto". Neste contexto, o padre António Vieira publicou o seu trabalho sobre o Império, sublinhando que ao rei português, identificado primeiro com D. João IV, e depois com os sucessores da nova dinastia que se foram sucedendo, caberia instalar a monarquia universal.

Por outro lado, Amante (2001) destaca que o sebastianismo se constitui como uma explosão de não esperança, uma manifestação do génio natural íntimo da raça, e uma abdicação da nossa história, pois Portugal procurava renegar, por um mito a realidade, morrendo para a história, desfeito num sonho. Segundo a mesma autora Portugal queria envolver-se para entrar no sepulcro, na mortalha de uma esperança messiânica.

Botelho (1990) salienta que a imaginação e o sonho que permeiam todo e qualquer ser humano encontram, no contexto particular português, a sua melhor tradução na espera do Encoberto, numa manhã de nevoeiro. Tal esperança acabou por ser usada como explicação para uma tristeza sem fim de toda uma pátria que se percebe enlutada, desejando por uma grandeza nacional pretérita a que urge voltar, a que tem direito.

De acordo com Eliade (1981) a religiosidade apresenta o mesmo fundo humano peculiar ao português, possuindo uma crença no milagre e nas soluções milagrosas. A mentalidade portuguesa complexa, que resulta da combinação de factores diferentes e, às vezes, opostos, dá lugar a um estado de alma sui generis que o português denomina de saudade.

Lourenço (1978) sublinha que saudade é um estranho sentimento de ansiedade que parece resultar da combinação de três tipos mentais distintos: o lírico sonhador mais aparentado com o temperamento céltico; o fáustico de tipo germânico e o fatalístico de tipo oriental. Por isso, o mesmo autor observa que a saudade é umas vezes um sentimento poético de fundo amoroso ou religiosa. Outras vezes é a ânsia permanente da distância, de outros mundos, de outras vidas. A saudade é então a força activa, a obstinação, que leva à realização das maiores empresas; é a saudade fáustica.

Porém, como analisa Amante (2001), nas épocas de abatimento, de desgraça, e de confusão a saudade toma uma forma especial, em que o espírito se alimenta das glórias passadas e cai no fatalismo de tipo oriental, que tem como expressão magnífica o fado, cujo nome provém do étimo latino fatu (destino, fadário, fatalidade).

Este temperamento paradoxal português explicitado correctamente por Fernando Pessoa, explica os períodos de grande apogeu e de grande decadência da nossa História, cheia de contradições.

 

 

Bibliografia

 

 

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* Professor Coordenador e Coordenador do Curso de Comunicação Social da Escola Superior de Educação de Viseu.