A organização do culto, embora
com pequenas variações entre
ilhas, e particularmente entre
estas e as comunidades de origem
açoriana nas Américas, o culto
assenta nas seguintes
estruturas:
A Irmandade — A irmandade
constitui o núcleo
organizacional do culto. É
composta por irmãos,
voluntariamente inscritos e
consensualmente aceites, todos
eles iguais em direitos e
deveres. Embora haja notícia de
antigas irmandades
exclusivamente masculinas, desde
há muito que homens e mulheres
participam sem diferenças. O
carácter igualitário das
irmandades, condicente com a
crença joaquimita, é bem
patente, não sendo aceites
diferenças por origem ou posses.
Esta regra foi raramente
violada, mas há notícia nalgumas
ilhas de Impérios dos nobres (o
mais conhecido e o único
sobrevivente é o da HORTA, hoje
sob responsabilidade da Câmara
Municipal) que apenas aceitavam
irmãos provenientes da
aristocracia local. As
irmandades são de carácter
territorial, constituindo-se
como verdadeiras associações de
vizinhos, agrupando famílias
residentes numa mesma freguesia
ou localidade, sem prejuízo de
aceitarem irmãos residentes
noutras localidades, desde que
tenham vínculo de origem ou
família à localidade onde se
situa a irmandade. As irmandades
têm um compromisso, mas em geral
regem-se por regras consensuais.
Sempre que a diocese ou as
autoridades civis tentaram
intervir em matérias das
irmandades depararam-se com
enorme resistência e indignação,
seguida de resistência passiva
que impediu a interferência.
O Império — Cada irmandade
estrutura-se em torno de um
Império do Divino Espírito
Santo, normalmente um pequeno
edifício com arquitectura
distinta em torno do qual se
realizam as actividades do
culto. A arquitectura dos
Impérios varia grandemente de
ilha para ilha, variando desde
um simples telheiro no tardoz
das igrejas na ilha de Santa
Maria até capelas vistosamente
ornadas e encimadas pela coroa
imperial na ilha Terceira. Aos
impérios está normalmente
associada uma dispensa ou
copeira, espaço destinado ao
armazenamento dos adereços
utilizados, dos víveres e
vitualhas e para confecção e
distribuição das funções e
demais refeições rituais. O
aparecimento generalizado dos
impérios como edifícios
permanentes em alvenaria data da
última metade do século XIX,
provavelmente em resultado do
retorno de dinheiro dos
emigrantes no Brasil e na
Califórnia. Até ali o culto
realizava-se em torno dos
treatros (e não teatros!),
palanques em madeira montados
especificamente para a ocasião.
Na diáspora açoriana,
particularmente na Nova
Inglaterra e no Canadá, para
além dos pequenos impérios, são
hoje comuns os grandes salões,
onde as festas se realizam em
ambiente fechado.
O Mordomo — Para cada celebração
os irmãos escolhem um irmão
responsável que recebe a
designação de mordomo. A escolha
é normalmente feita pela
retirada de pelouros, bilhetes
em papel onde é inscrito um
nome, enrolados e colocados num
saco ou chapéu, de onde são
retirados por uma criança. A
maioria das irmandades admite a
existência de mordomos
voluntário, que se oferecem a
realizar a festa em resultado do
cumprimento de promessa feita
para recebimento de uma especial
graça do Divino Espírito Santo.
Ao mordomo cabe coordenar a
recolha de fundos para a festa e
coordenar a sua realização,
sendo para tal efeito
considerado a autoridade suprema
a que todos os irmãos estão
obrigados a estrita obediência.
No que respeita às crenças, que
estão por detrás da organização
acima descrita, elas entroncam
directamente no joaquimismo. São
elas:
A esperança — os devotos esperam
a chegada de um tempo novo onde
todos os homens serão irmãos e
onde o Espírito Santo será a
fonte de todo o saber e de toda
a ordem.
A fé no Divino e nos seus sete
dons — o Divino Espírito Santo
está presente em todo o lado,
tudo sabe e tudo vê, não havendo
para ele segredos. As ofensas ao
divino são punidas severamente
(Diz-se: O Divino Espírito Santo
é vingativo), não ficando
impunes as promessas não
cumpridas. Os Sete Dons do
Espirito Santo (Sabedoria,
Entendimento, Conselho,
Fortaleza, Ciência, Piedade e
Temor) são a fonte de toda a
virtude e de toda a sabedoria,
devendo guiar os irmãos.
O igualitarismo — todos os
irmãos são iguais e todos podem
ser mordomos, e todos podem ser
coroados assumindo a função de
imperador, merecendo igual
respeito e obediência quando
investidos dessa autoridade. É a
expressão prática do
igualitarismo joaquimita.
A solidariedade e a caridade —
na distribuição do bodo e das
pensões, devem ser privilegiados
os mais pobres para que todos
possam igualmente festejar o
Divino Espírito Santo. Todas as
ofensas devem ser perdoadas para
se ser digno de receber o Divino
Espírito Santo.
A autonomia face à Igreja — o
culto do Divino Espírito Santo
não depende da organização
formal da igreja nem necessita
da participação formal do clero.
Não existem intermediários entre
os devotos e o Divino. É clara a
influência do pensamento
joaquimita, preferindo a igreja
mística à igreja formal.
Os rituais do culto assentam num
conjunto de objectos simbólicos
e em cerimónias visando a
representação directa das
crenças subjacentes. São eles:
A coroa, o ceptro e o orbe — são
os símbolos mais importantes do
Império do Divino Espírito
Santo, assumindo o lugar central
em todo o culto. A coroa é uma
coroa imperial, em prata,
normalmente com três braços,
encimada por um orbe em prata
dourada sobre o qual assenta uma
pomba de asas estiradas. O
tamanho da coroa varia, e em
geral cada irmandade dispõe de
uma coroa grande e duas mais
pequenas. Cada coroa é
completada com um ceptro em
prata, encimado por uma pomba de
asas estiradas. A coroa é
decorada com um laço de fita de
seda branca, o mesmo acontecendo
com o ceptro. Por vezes os
braços da coroa são decorados
com pequenos botões de flor de
laranjeira em tecido branco. A
coroa é colocada sobre uma
bandeja de pé alto, também em
prata. Simboliza o império do
Divino Espírito Santo e o seu
poder universal. Para além de
servir para coroar, é
considerada uma honra, conferida
pelo imperador, transportar a
coroa e segurar a respectiva
bandeja. Durante o ano as coroas
circulam semanalmente entre as
casas dos irmãos, que as colocam
em lugar de honra, rezando e
louvando o Divino, todas as
noites, perante elas. As coroas
são também transportadas pelos
mordomos quando realizam
peditórios.
A bandeira — a bandeira é
confeccionada em damasco
vermelho vivo, normalmente de
dupla face, de forma
quadrangular, com 5 palmos de
lado (embora existam bandeiras
maiores e menores), sobre o
centro da qual é bordada em
relevo uma pomba branca da qual
irradiam para baixo raios de luz
em branco e fio de prata. A
bandeira é colocada numa haste
em madeira com cerca de dois
metros de comprido, encimada por
uma pomba em prata ou latão. A
bandeira acompanha a coroa e
está sempre presente nas
cerimónias litúrgicas onde se
coroe. Uma bandeira menor é
içada junto à casa do imperador
durante a permanência das
coroas. Junto aos impérios é
hábito existir um grande mastro
no qual é içada durante as
cerimónias uma grande bandeira
de tecido branco onde estão
pintadas cenas alusivas ao
culto. É considerada uma honra
ser escolhido para levar a
bandeira nos cortejos.
O Hino — o Hino do Espírito
Santo, composto em finais do
século XIX para ser tocado pelas
bandas e ser cantado durante as
coroações, é o mais reverenciado
de todos os hinos, sendo sempre
escutado nos Açores com grande
emoção e respeito. Alguns dos
acordes estão patentes no Hino
dos Açores.
As varas e as fitas — claramente
inspiradas nas antigas varas
municipais e dos juízes, as
cerimónias e cortejos são
acompanhadas por um número
variável de varas em madeira
polida (em geral 12), com cerca
de 1,5 m de comprido, encimadas
por um suporte no qual é
possível colocar uma vela.
Algumas varas são decoradas com
fitas brancas e vermelhas.
Notros casos são colocadas sete
fitas, todas de cor diferente,
representando os sete dons do
Espírito Santo. Nas cerimónias
de coroação, são colocadas velas
que se acendem durante o acto.
Nos cortejos as varas rodeiam as
coroas, nalguns casos sendo
seguradas por dois participantes
e colocadas de forma a formar um
quadrado em torno de cada coroa.
Nalgumas irmandades existe uma
vara extra, mais cumprida e sem
suporte para vela, por vezes
pintada de branco, que é
entregue pelo imperador a uma
pessoa que se responsabiliza por
mater o cortejo em boa ordem.
Esta vara é por vezes referida
como o "enxota porcos", talvez
uma referência aos tempos em que
os animais domésticos andavam
pelas ruas e precisavam de ser
afastados para o cortejo passar.
O imperador escolhe para levar
as varas pessoas, normalmente
jovens, que deseje honrar.
O cortejo, império ou mudança —
no dia de Páscoa as coroas são
transportadas para a igreja,
fazendo-se no final da missa a
primeira coroação, depois de
coroado, o imperador parte para
sua casa, acompanhado por um
cortejo, acompanhado pelos
irmãos, que é aberto pela
bandeira e termina pelas
coroados rodeados pelas varas.
Atrás vai normalmente uma
filarmónica que acompanha com
música alegre o percurso.
Chegados a casa do imperador, as
coroas são colocada num trono
armado em madeira revestida de
papel branco e de flores,
ficando em exposição toda a
semana. Todas as noites, os
vizinhos e convidados reúnem-se
para um pequeno convívio, por
vezes incluindo danças, que
termina pela recitação do terço
e de orações alusivas ao Divino
Espírito Santo. No domingo
seguinte, as coroas partem
novamente em cortejo para a
igreja, sendo recebidas à porta
pelo pároco, que entoa o
Magnificat. O processo repete-se
até ao Domingo do Bodo (o sétimo
após a Páscoa), e nalguns casos
até ao 2.º Bodo (o Domingo da
Trindade - 8.º após a Páscoa).
Começa a ser comum fazer
cortejos durante o Verão,
normalmente associados a funções
oferecidas por emigrantes em
férias.
A coroação – a coração é feita
após o termo da missa e consiste
na colocação, pelo sacerdote, da
coroa na cabeça do imperador ou
das pessoas que ele designar, e
na imposição do ceptro, que
depois de beijada a pomba que o
encima, é empunhado pelos
coroados. Os fiéis assistem de
pé à coroação, sendo por vezes
cantado o Hino. Depois da
coroação, inicia-se o cortejo,
sendo o imperador seguido até à
porta pelo sacerdote, que canta
o Magnificat.
O bodo — No 7.º domingo após a
Páscoa (dia de Pentecostes)
realiza-se o bodo. Nesse dia, o
cortejo depois de sair da igreja
dirige-se ao império, sendo as
coroas e bandeiras aí colocadas
em exposição. Frente ao império,
em longos bancos corridos são
colocadas as esmolas, que depois
de abençoadas são destribuídas.
Os irmãos recebem-nas e todas as
pessoas que passam podem
livremente servir-se de pão e
vinho. No entretanto são
arrematadas as oferendas,
normalmente gado, alfenim e
massa sovada. O bodo é
organizado e gerido pelo mordomo
e por quem ele designe.
Terminado o bodo as coroas
recolhem em cortejo a casa do
mordomo. A segunda-feira
imediata é o Dia dos Açores, ou
dia da pombinha.
A esmola ou pensão — é
constituída por uma porção de
carne de vaca (de gado
especialmente abatido para o
efeito), por um pão de cabeça
(ou pão do bodo), e por vinho de
cheiro. É distribuída aos irmãos
que as pretenderem e às famílias
mais necessitadas.
A função — é uma refeição ritual
servida a um numeroso grupo de
convidados por um dos irmãos,
normalmente em resultado de um
voto ou promessa. A refeição
consiste de “sopa do Espírito
Santo” (pão seco que depois é
recoberto com água de cozer
carne, temperada com hortelã e
outros condimentos), o cozido de
carne, pão de água, a massa
sovada (um pão de massa doce e
rico em ovos) e arroz doce
polvilhado com canela. Na
Terceira é por vezes incluída a
alcatra, um prato de carne
cozinhada em vinho num alguidar
de barro. A função simboliza a
partilha e é servida na presença
das coroas e da bandeira, sendo
acompanhada por cantigas
alusivas ao Império do Divino
Espírito Santo, normalmente
cantadas por foliões.
A briança — é um cortejo em que
o gado que vai ser abatido para
o bodo ou arrematado é mostrado
á comunidade, com flores de
papel colorido coladas na
pelagem e acompanhado por
foliões ou cantadores de
cantigas ao desafia. O cortejo
para à porta de cada família que
contribuiu, sendo então cantadas
cantigas alusivas. Durante o
percurso é tocada a briança
(música tradicional para este
evento) ou um pezinho adequado.
Ceia dos criadores — são
jantares organizados em honra
dos lavradores que contribuíram
com gado ou das pessoas que
deram ofertas relevantes à
irmandade. Funciona como momento
de recolha de fundos, sendo
tradição em algumas ilhas
convidar figuras ilustres as
política ou da vida social
local.
Os foliões — são pequenos grupos
de até 5 pessoas, os Foliões do
Divino, que, com as suas
cantigas, acompanhadas por
tamboreste e címbalos,
participam da preparação das
Festas do Divino, visitando as
casas dos irmãos, cantando os
feitos e os poderes do Divino
Espírito Santo, recolhendo
donativos e marcando os rituais
da distribuição do bodo ou da
função.(in Wikipédia)