
José Orlando
Bretão (Angra do Heroísmo, 14 de
Abril de 1939 — Angra do
Heroísmo, 24 de Outubro de 1998)
foi um distinto advogado do
movimento sindical e acérrimo
defensor da democracia durante a
vigência do Estado Novo.
Como estudioso do folclore
açoriano, em especial das danças
de Carnaval e das festividades
do Espírito Santo, José Bretão
deixou-nos imensa e preciosa
informação recolhida junto do
povo simples do "campo", como
por exemplo este depoimento
registado em 1996 de Gregório
Machado Barcelos, lavrador
octagenário, quando questionado
sobre os "dons do Espírito
Santo"(1):
"É
bom que o senhor me
pergunte, porque acho que na
cidade falam, falam e
acertam pouco. Sem ofensa,
até acho que não sabem nada,
de nada. Mas eu digo como é
que meu pai dizia e o pai
dele lembrava muitas vezes
como era. Eu digo que os
dons do Espírito Santo são
sete e são sete porque é
assim mesmo, é um número que
vem dos antigos, como as
sete partidas do Mundo ou os
sete dias da semana e não
vale a pena estar a
aprofundar muito porque não
se chega a lado nenhum e só
complica. E o primeiro dom
do Espírito Santo é a
Sabedoria – é o dom da
inteligência e da luz. Quem
recebe este dom fica homem
de sabença. Os apóstolos
estavam muito atoleimados e
cheios de cagança e veio o
Divino que botou o lume nas
cabeças deles e eles ficaram
mais espertinhos. Depois vem
o dom do Entendimento. Este
está muito ligado ao outro,
mas aqui, quer dizer mais a
amizade, o entendimento, a
paz entre os homens. Este é
assim: o Senhor Espírito
Santo não é de guerras e
quem tiver pitafe dum
vizinho deve de fazer logo
as pazes que é para ser
atendido. E o terceiro dom
do Espírito Santo é o do
Conselho – o Espírito Santo
é que nos ilumina a indica o
caminho. É a luz, o sopro ou
seja, o espírito. É por isso
que tem a forma de uma
Pomba, porque tudo cria e é
amor e carinho. O quarto dom
é o da Fortaleza, que vem
amparar a nossa natural
fraqueza – com este dom a
gente damos testemunho
público, não temos medo.
Quem tem o Senhor Espírito
Santo consigo tem tudo e
pode estar descansado.
Depois vem o dom da Ciência,
do trabalho e do estudo. O
saber porque é que as coisas
são assim e não assado. É
não ser toleirão nem
atorresmado como muitos que
há para aí. O senhor sabe! O
dom da Piedade e da
humildade é o sexto dom.
Quer dizer que o Senhor
Espírito Santo não faz
cerimónia nem tem caganças.
Assim os irmãos devem ser
simples e rectos. E depois,
por derradeiro, vem o sétimo
dom que é o Temor mas não é
o temor de medo. É o temor
de respeito – para cá e para
lá. A gente respeita o
Espírito Santo porque o
Senhor Espírito Santo
respeita a gente. Temor não
é andar de joelhos esfolados
ou pés descalços a fazer
penitências tolas: é fazer
mas é bodos discretos com
respeito mas alegria que o
Espírito Santo não tem
toleimas nem maldades
escondidas. É isto que são
os sete dons do Espírito
Santo e o senhor se
perguntar por aí ninguém vai
ao contrário, fique
sabendo".
(1)Hélder da Fonseca Mendes,
Festas do Espírito Santo nos
Açores - Proposta para uma
leitura teológico-pastoral.
Angra do Heroísmo, 2001: 90-91