Hoje é o primeiro Domingo de Bodo!

Neste primeiro Domingo de Bodo , a chuva cai em abundância!

Que pesar sinto, pois penso de imediato nas crianças que tanto esperaram por este dia , para irem nas coroações do Divino Espírito Santo.

Coitaditas... algumas nem dormiram bem ,desejosas que amanhecesse , para se vestirem com seus vestidos brancos, vaporosos e arranjarem os seus cabelos, com florezinhas, bandoletes ou fitas vaporosas, com que ficam graciosas!

Eu falo por mim, pois mal dormia, tal era a agitação na véspera, desde que ia para a cama até ao amanhecer.

Vou descrever como eram os meus vestidos e sapatos daquele tempo:

Por exemplo: se num ano, a minha avó ia à costureira para me fazer um vestido, dizia sempre que queria que aquele vestido durasse para dois ou três anos. Ora, a costureira, Sra. Bia , ( uma santa mulher), o que podia fazer era, deixar nas costuras dos lados, na altura da cintura e nas bainhas, uns fartos 5cm a mais, para nos anos seguintes se ir pondo "para fora".

A minha avó fartava-se de me recomendar, que não me chegasse para as paredes para não sujar o vestido, pois na época as casas levavam uma barra preta de pixe , nas ombreiras das casas, e na época do Bodo, toda a gente pintava a casa com cal branca e por baixo as referidas barras de pixe !

Também me proibia de antes, durante e depois da coroação comer o que quer que fosse de guloseimas, e nem a brindeira de massa sovada trincar; tinha de vir inteirinha para casa.

Chegada a casa, despia logo o vestido branco, e vestia um outro normal, mas melhorzinho, pois como era dia de festa, havia uma exceção!

Quanto aos sapatos, também tinham uma história...eram feitos pelo meu avô, que era sapateiro, e quase sempre duravam dois anos. Numa certa idade, entre os três e quatro anos, nem apertavam muito, mas lembro-me perfeitamente, de ir a várias coroações, e devido ao aperto dos sapatos, vir com os calcanhares a sangrar, e mortinha por os tirar dos meus pezinhos doloridos de tanto apertados!

Mas, no fundo gostava muito de ir nas coroações, e passava uma época diferente. Era uma maneira de sair, de confraternizar e de ao mesmo tempo me divertir.

Durante o ano, não íamos muito para festas. Éramos pobres, não havia carros como os há hoje, e mesmo havendo urbanas e carros da carreira, era preciso dinheiro para os bilhetes, e primeiro era a despesa da casa, a água , luz, e comida, e só depois se restava algum extra, se ia dar um passeio nas proximidades.

À noite, era a iluminação do que eu mais gostava!

Passear com as minhas amigas, no arraial , ouvindo a Filarmônica a tocar no coreto, e nos intervalos, havia as arrematações de Massa Sovada e Alfenim .

Na segunda feira era uma alegria. Logo pela manhã a minha avó vestia-me um lindo avental, quase sempre bordado, com grandes "fachas" (faixas), com que fazia um lindo laço!

Por volta das 10 horas, o pessoal começava a chegar ao terreiro. Chegavam as vacas com sua tetas cheias e algumas a derramar o leite. Em seguida os mordomos da festa, traziam umas enormes açafates feitos com vimes, decorados com toalhas brancas bordadas a Richelieu , cheias com fatias de massa Sovada. A música começava a tocar, e então gerava-se ali um clima de alegria e festa!

Só de narrar estes acontecimentos, estou a recordar tudo; tanto, o ambiente, como os cheiros característicos das vacas, e da massa, e também das Faias, pois usavam colocar galhos de Faia da Terra nas bermas da rua e no terreiro.

Até parece que ouço a música, e que estou lá (agora) naquele bom  e saudoso tempo!

Assim era o dia do Bodo da minha Infância!

 

 

Estas flores de seu nome, Boninas, são usadas para enfeitar os bezerros do Divino Espírito Santo, nas altura dos Bodos.

 

 

Publicado por chicailheu -

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